UM LOBO EM JERUSALÉM
Devo confessar que nutro uma especial admiração pelo escritor António Lobo Antunes. A sua escrita, dura, crua, torrencial e cuja leitura é sempre um desafio atrai-me como poucas. Quanto ao cidadão Lobo Antunes é conhecido de todos o seu mau feitio (que dizem esconder uma grande timidez), a sua relutância em dar entrevistas, a dificuldade em lhe arrancar palavras e a forma como embaraça os jornalistas ou entrevistadores com respostas ou comportamentos inesperados. No entanto, parece-me que o Lobo Antunes dos últimos anos mostra-se mais acessível, mesmo mais humilde como o próprio confessou recentemente ao Jornal de Notícias a propósito da comemoração dos seus 25 anos de publicação.
O escritor português encontra-se actualmente em Jerusalém para receber o prestigiado prémio “Jerusalém”, sendo curioso que embora o único livro publicado naquelas bandas em Hebraico seja “O auto dos danados”, as publicações em inglês das suas outras obras são muito frequentes em Israel.
De visita à Cidade Santa era quase impossível deixar de questionar Lobo Antunes a respeito do conflito Israelo Palestiniano. O escritor fez uma comparação entre este conflito e o que se passa em África, isto é, trata-se de uma luta em que todos querem a sua terra e em que todos parecem ter uma parte da razão. Mas aquilo que mais me chamou a atenção foi, sem dúvida, a resposta do escritor quando questionado sobre a possível resolução deste conflito, o autor respondeu que talvez a solução esteja nas mulheres e mais particularmente nas mães, só quando estas se fartarem de ver os seus filhos morrerem terminará o conflito. Quanto aos homens, disse, esses gostam de matar e provar sempre que têm uma arma maior que o adversário…
Talvez, talvez…
NAP
2 Comments:
Recomendo, antes de mais, um pouco de espírito crítico(devida e condignamente crítico, na boa tradição do que K.Popper, com propriedade, designaria, racionalismo crítico) ao autor do texto. Insofismavelmente,é Lobo Antunes aquilo que devidamente se designa por Escritor, na mais legítima acepção do termo. Quanto aos seus méritos enquanto Profeta, creio que não serão estes suficientes para lhe permitirem auferir ao Nobel que, presumivelmente, a literatura lhe atribuíra. Quando as Mães se fartarem? Curiosamente, sempre que atendi televisivamente à informação relativa a este conflito, raras foram as vezes em que a presença de uma tétrica mulher, envergando sobre os braços uma criança, foi alvo de dispensada. Mais tarde darei continuidade a esta reflexão(obviamente não crítica), mencionando aspectos que inelutavelmente se increvem neste conflito como sendo responsáveis pela sua continuidade ad eternum.
Caro mlg: seguindo a sua recomendação, vou por em prática o meu “espírito crítico”, procurando com as minhas modestas reflexões contribuir para o fortalecimento desse “espaço público”, ou “fora” como lhe prefere chamar o “filósofo da carne” (José Gil), ainda incipiente (ou inexistente).
No que a Lobo Antunes concerne, disse no post e reafirmo-o: admiro a sua escrita! Acho-a difícil, dura, por vezes a leitura do médico quase que chega a ser dolorosa, mas (chame-me masoquista) gosto de continuar a lê-lo. E, mais ainda, acho que o Nobel a Lobo Antunes é da mais elementar justiça; o autor reinventou a arte de escrever o Romance, não sou eu que o digo, mas vários estudioso, entre as quais Maria Alzira Seixo. A título de curiosidade, enquanto que durante vários anos (demasiados) Lobo Antunes foi mal amado, preferindo dar-se a primazia a outros escritores bem menos originais, e enquanto ainda hoje, apesar de o seu valor e reconhecimento estarem sedimentados e consagrados, certo é que não se vê nenhum movimento de relevo a fazer força, a pressionar (se quiser) pela atribuição do galardão da Academia Sueca ao escritor; já em Nova Iorque, imagine-se, um grupo de intelectuais reuniu-se propositadamente para fazer lobiing precisamente para que Lobo Antunes seja premiado. Esperemos que não seja a título póstumo.
Quanto aos comentários políticos (?) do autor, e sem querer estar a fazer de advogado do mesmo, devo dizer que ele sempre se mostrou muito relutante em tecer qualquer tipo de referências do género. E apesar deste comentário ser uma excepção, a minha curiosidade em relação à sua singela frase deveu-se pura e simplesmente à lhaneza da observação. Eu não estava à espera de ouvir uma qualquer dissertação político diplomático do escritor, nem muito menos uma condenação boçal e simplista a uma das partes. Lobo Antunes é um escritor e limitou-se a sê-lo quando questionado sobre a solução desta tragédia; a resposta do autor foi simples e bela, não política.
Do ponto de vista político, toda a gente tem presente que é um conflito complexo, em que não existem de um lado inocentes e do outro culpados. Há-os de ambos os lados, tal como existe de ambos os lados gente de boa e de má vontade. A solução do conflito Israelo - palestiniano exige um esforço diplomático de países determinantes na ordem mundial, como os Estados Unidos, mas também de países influentes do Médio Oriente, como o Egipto, os quais têm de estar empenhados na conquista de compromissos assentes numa vontade real de cooperar, de estabelecer a Paz. Mas quer-me igualmente parecer que só com líderes fortes, de ambos os lados, capazes de impor o resultado das negociações e incapazes de ceder a interesses sectários será alcançada a Paz.
Sobre este assunto muito há, sempre a dizer, mas há sempre muito mais a fazer.
Convido-o, desde já, a estar presente nas conferência, precisamente sobre esta temática, a realizar no dia 11 de Abril, no âmbito do ciclo de debates da ELSA.
NAP
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