25 fevereiro 2005

DAY AFTER

Revelei-me sempre muito céptico em relação à obtenção de uma maioria absoluta por parte do Partido Socialista. Vaticinei neste blog que a vitória era praticamente certa, a única coisa que importava esclarecer era a existência ou não de uma maioria na Assembleia da República. O sufrágio de Domingo veio dar uma resposta inequívoca a estas dúvidas. Os eleitores decidiram, em primeiro lugar, dar uma vitória absoluta, e portanto histórica, ao PS, em segundo lugar, fazer uma viragem à esquerda, com o Partido Comunista e o Bloco de Esquerda a subirem em votação e número de mandatos, em terceiro lugar fazer desta votação, em certa medida, uma votação punitiva.

PSD e PP foram os dois grandes derrotados destas eleições. Embora se tenham apresentado a eleições separadamente, procurando o PP distanciar-se do PSD e chamando a si os (parcos) louros da governação cessante, assistiu-se a uma verdadeira fuga do voto à direita, de tal forma que sucedeu algo de inédito: a esquerda conseguiu congregar quase 60% dos votos. Não podemos esquecer, todavia, que o PSD é um partido matricial do sistema político e democrático português e que uma votação como a que foi obtida por este partido talvez não seja aquela que melhor sirva os interesses da própria democracia, mas este resultado não deixa de ser um sintoma do descontentamento popular com os sociais democratas.

Aos apelos contínuos de Sócrates para uma maioria absoluta capaz de oferecer estabilidade governativa e, diga-se, possibilidade de implementar o programa de governo sem estar constantemente à procura, na oposição, de uma solução que nem sempre se afigurara como a mais digna (lembremo-nos dos tristes episódios do queijo…), a resposta foi muito clara – maioria absoluta. Mas esta maioria é pesada e constitui, na minha opinião, o maior teste às capacidades governativas dos socialistas desde a instauração da democracia em Portugal. Com a maioria dos deputados o PS tem desde logo a possibilidade de não ceder naquilo que considera ser essencial e que marca o tal “novo rumo” que os cartazes eleitorais apregoavam. Esta maior força no executivo de Sócrates concede-lhe maior margem de manobra no conjunto de personalidades a convidar para o governo. Figuras influentes e competentes, quer do partido quer da sociedade civil que veriam numa maioria relativa amarras suficientes para recusarem uma pasta ministerial, encontram agora um cenário bem mais atractivo, daí que o leque de ministeriáveis seja bem mais amplo do que na solução de maioria relativa.

Certo é que as condições para mudar Portugal estão reunidas. Há maioria, existem pessoas competentes dispostas a trabalhar, a população, mais do que nunca, está ciente da crise e das deficiências de que enferma o Estado e a Sociedade portuguesa e portanto sensíveis para adoptar as medidas necessárias. O PS não terá desculpa para não executar as reformas urgentes da Administração Pública, na Saúde, na Educação, para não combater fortemente o desemprego e tornar Portugal um país mais atractivo para o investimento estrangeiro. Não pode cair, porém, no erro de querer fazer tudo de novo, importa aproveitar o que de bom foi feito pelo governo da Coligação, e acima de tudo ter coragem, porque tem sido isso que falta à governação, coragem para afrontar as corporações (advogados, médicos, farmacêuticos, sindicatos…), estabelecer objectivos a médio e longo prazo e stick to the plan.

Um falhanço por parte do PS será penalizado como nunca pela sociedade portuguesa. Se estes resultados eleitorais foram penalizadores para uma direita coligada, o castigo seria muito maior para um partido único com todas as condições para mudar o status quo. Que assim seja!

NAP